Sacerdotisas voduns e rainhas do Rosário: mulheres africanas e Inquisição em Minas Gerais (século XVIII)

Aldair Rodrigues & Moacir Maia (org.)

Especificações

192
páginas
ano
2023
260 g
ISBN
978-65-80341-12-2
ISBN (e-book)
978-65-80341-16-0

Sacerdotisas voduns e rainhas do Rosário: mulheres africanas e Inquisição em Minas Gerais (século xviii) reúne transcrições de documentos inéditos sobre a vida e as crenças de mulheres africanas perseguidas no Brasil por forças militares e pela Inquisição.

Essas mulheres pertenciam a grupos étnicos que habitavam a região da África ocidental chamada pelos portugueses de Costa da Mina. Escravizadas e trazidas para o Brasil, algumas se tornaram lideranças de comunidades negras na posição de sacerdotisas voduns (vodúnsis), ao mesmo tempo que exerciam cargos de juízas e rainhas da irmandade católica de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos — a principal confraria negra mineira.

Os manuscritos dos processos contra as sacerdotisas foram localizados em Portugal no Arquivo da Torre do Tombo, entre os códices do Tribunal da Inquisição de Lisboa. O primeiro, de 1747, descreve um complexo culto em Paracatu (mg) dedicado ao “Deus da Terra de Courá”. O segundo e o terceiro referem-se a Ângela Gomes, “mestra” de práticas rituais africanas na comarca de Ouro Preto, coroada como rainha do Rosário. O quarto, datado de 1759, oferece detalhes sobre as práticas de Teresa Rodrigues e Manoel mina na comarca de Sabará.

Sacerdotisas voduns e rainhas do Rosário inclui também papéis preservados nos arquivos históricos de Minas Gerais. Embora registrados por agentes do Império português, os depoimentos reproduzidos nos processos desvelam a multiplicidade de vozes e das trajetórias de vida das mulheres africanas, evidenciando a ideologia e a violência do racismo religioso.

Aldair Rodrigues é mestre e doutor em história pela Universidade de São Paulo e professor do Departamento de História da Unicamp desde 2016.

Moacir Maia é doutor em história social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Coordena projetos de preservação, digitalização e universalização de fontes históricas no Brasil e no exterior.

Vídeo

Sacerdotisas voduns e rainhas do Rosário

Os historiadores Aldair Rodrigues e Moacir Maia falam sobre “Sacerdotisas voduns e rainhas do Rosário: mulheres africanas e Inquisição em Minas Gerais (século XVIII)”, no fHist "Histórias para não esquecer", em Ouro Preto

Trecho

E um dia veio à minha casa meu freguês Miguel Afonso Peixoto dizendo viva a fé de Jesus Cristo. E lhe respondi se havia algum herege nesta freguesia e me disse que a dita Ângela era feiticeira; e que tinha feito muitos danos nesta freguesia por meio de malefícios e que a mandasse chamar e a repreendesse asperamente. […] Há cinco anos tenho feito observação no modo de viver desta mulher e acho que todas as noites das terças e sextas-feiras, de cada semana, depois da meia-noite, na casa da dita ouço uns calundus do inferno, estranhos e horrendos, que muitas vezes fazem tremer as casas em que vivo. E, em uma noite de julho do ano de cinquenta e nove, fez tais diabruras, que me privou do sono daquela noite […]. E eu lhe disse que era feiticeira, que eu tinha ouvido tudo […].

Porque sempre continuam na sua diabrura, e nunca cessaram as queixas contra ela. Em uma quarta-feira de novembro de cinquenta e nove, as mesmas horas acima ditas, estando eu gravemente enfermo de cama se achavam em minha casa o licenciado Manuel Dias Farinha e sua mulher Quitéria Maria da Silveira, meus compadres, que me vieram assistir. Pelas mesmas horas acima ditas, principiou a dita Ângela Maria Gomes as danças com os demônios e fez coisas tão horrendas, que me foi necessário chamar aos ditos para ouvirem e com efeito vieram, e ouviram. E o dito Manuel Dias pegou em um ferro, que tinha no meu quarto, e saiu pela porta do meu quintal, quis saltar o muro que divide o meu quintal e o da dita negra, porém assim que chegou ao muro, logo se calou.

Denúncia contra Ângela Maria Gomes, courana, 1760

Avaliações

  1. Maria Cristina Ferreira

    Adorei o texto/matéria. Fiquei querendo saber mais dessa temática tão interessante e invisibilizada pelo racismo.

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